Houve deportações em
massa do Brasil de volta para a África? O que Carneiro da Cunha afirma ter
acontecido, de fato, em relação ás deportações?
No que concerne à primeira parte da questão,
se houve deportação, em massa, de Africanos escravizados para a África? A
autora sinaliza que não houve. Ela ressalta, porém, que “há indícios (...) de
que (...) as camadas dominantes (...) Na primeira metade do século XIX, pensava
seriamente na deportação maciça da população negra, esse, segundo ela, era um
pensamento corrente entre eles, Carneiro
da Cunha assegura que, não faltou vontade da elite brasileira da época em
levar a frente o projeto das deportações, todavia este esbarrava no entrave
financeiro, (foram sobretudo as precárias
finanças do Império que impediram a consecução de tão grandiosos projetos,
Página 110, linha 33). Segundo o argumento da autora era necessário
recursos para custear a dispendiosa logística. Tal empreendimento demandava o
estabelecimento, por parte do governo, de uma colônia em África, à imitação das
que possuíam os americanos do norte, e ainda, fundos suficientes para a compra
do local, transporte dos escravos libertados, aquisição dos instrumentos e
utensílios necessários à sua subsistência no primeiro ano.
Para melhor compreender as razões pelas quais “esse
projeto” (deportações em massa de Africanos de volta pra África) veio á tona, é
preciso conhecer o contexto histórico brasileiro em meados do século XIX.
Existia uma necessidade de se criar um projeto de nação, tendo como base,
“ideais liberais”, o que antagonizava gritantemente com a heterogeneidade
populacional, marcada pela “forte presença de pessoas negras”. A autora relata
citando o cronista francês Tollenare
que: “Os homens de cor os embaraçam,
página 108, linha 09". A ideia mestra, desse projeto de nação
defendida, entre outros, por José Bonifácio é de que “uma nação tem de ser homogênea para ser legítima, tem de ser homogênea
para ser estável também, e até plausível”. A ideia de homogeneidade era,
segundo Carneiro da Cunha, uma tentativa de aproximação da noção de “Estado-nação”
europeia e a homogeneidade necessária à existência da nação passava pela
exclusão dos negros. Uma nação de livres, sim, mas de livres brancos. Burlamaqui, (cientista brasileiro) e
anti escravista, é explícito: “É também
certo que as duas raças igualmente livres não podem viver debaixo do mesmo
governo, a natureza, o habito e a opinião tem estabelecido entre elas barreiras
indestrutíveis, página 109, linha 01”. Para Francisco Gonçalves Martins,
presidente da província da Bahia que chegou ao cargo em uma época crucial, a do
término efetivo do tráfico africano, era preciso favorecer o trabalho livre nas
cidades, excluindo porém os africanos libertos. Estes, em nome da segurança
pública, são encorajados a voltar para a África.
Diante do exposto, torna-se cristalino o forte
desejo das elites em desfazer-se da massa populacional negra acumulada durante
a escravidão, nesse contexto ganha força a ideia de deportação. Desejo de
deportação era tão grande que, citando Pierre Verger a autora cita um fato em
que, aparentemente, o chefe da polícia da Bahia chegou a tentar impor a um
navio holandês que levasse para El Mina
(na costa da atual Gana) africanos libertos que se achavam presos. Isso sem sequer
o governo pagar a passagem, (P. Verger. 1968: 538). Ainda citando (Verger, 1966: 359 363-4), Carneiro da
Cunha esclarece que, sem meios (recursos financeiros) para fazer uma colônia em
África, o que na prática ocorria era a execução de leis repressivas, o
vice-cônsul inglês da Bahia, Wetherell,
menciona que a posse dos "elegantes escritos árabes" era o suficiente
para a polícia clamar por conspirações e assassinatos, insurreições de escravos
e matanças A pós a Revolta dos Malês, e a criação da lei de 13 de maio de 1835,
que permitia "reexportar africanos forros de qualquer sexo, suspeitos de
promover de algum modo a insurreição de escravos", além dos 150 africanos
libertos deportados, setecentos pediram passaportes para fora do Império.
Era, portanto unanime o desejo, entre as
elites de “livrar-se”, através da deportação, dos negros escravizados, assim
surgia diversas narrativas a fim de justificar tal procedimento, uma delas é a
do deputado pela Bahia, Calmon du Pin e
Almeida que foi também ministro das Relações Exteriores, ao defender a
deportação ele atribui a “Divina Providência” a possibilidade de, caso
ocorresse, ao mesmo tempo que se extirpava do Brasil a ameaça de insurreições,
se cedia o lugar a uma "mão de obra mais útil" (Imigrante Branco),
além disso formava-se em África "um núcleo de população, ou talvez um novo
Estado que, participando da civilização (Brasileira) e falando nossa língua,
contribuirá um dia para a extensão de nosso comercio e nossa indústria
nascente.
O que pode ser observado no trabalho da
Carneiro da Cunha é que não havia definitivamente um mínimo reconhecimento da
importância da mão de obra escrava na construção do país, pelo contrário estes
eram vistos a partir de meados do século XIX como uma espécie de estorvo, um
empecilho para o desenvolvimento, este presente na mão de obra livre branca de
imigrantes europeus, os negros, aquela altura, após serem explorados das formas
mais desumanas possíveis, precisavam ser descartados, “jogados para fora do
império”, (em qualquer lugar da Africa,
página 110, linha 17),de preferência sem custo algum, em gritante paradoxo
ás riquezas e fortunas geradas por essa mão de obra.
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